As peras.
Quando cheguei à cozinha pela
manhã, lembrei das peras repousadas na fruteira, postas ali para o tempo as
amadurecer - como acontece conosco, aliás. Túrgidas e perfumadas, guardavam a promessa perfeita de sabor.
Mas
fui traído à primeira mordida: a areia do seu gosto já tinha se esvaído de todo.
Lembrei daquele poema de
Ferreira Gullar, o único que lembro com frequência, e por isso mesmo o mais
precioso, quando ele dizia as peras cansaram-se de suas formas e de sua
doçura. As peras dele eram como as
minhas. Inocentes e insípidas, esgotadas de tanto esperar.
Pensei então que, de certa
forma, esperar seria tornar-se pera, aguardar o momento certo de ser doce e
inesquecível. E desesperar-se é deixar de ser pera, esquecer o sabor que a vida
nos dá e nos entregarmos ao azedume. Mas, principalmente, pensei que o melhor não é ser uma
coisa, nem outra.
Bom mesmo é jamais deixar de ser pera, prolongando a doçura pela vida
inteira.
2 comentários:
Eu não gosto de pera, amorzinho, mas adoro cheirar você de perfume novo. :*
Quero um post sobre natação!
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