
Voando em torno da lâmpada.
Eu aqui, às nove da noite, tocando violão para uma mariposa. E me pergunto qual de nós está mais sozinho. A mariposa tem a noite, com suas infinitas estrelas. Eu, o violão e a música, com suas mil canções - mas que eu só sei tocar meia dúzia. A mariposa não tem como se dar conta do infinito que a cerca. Mas disso eu não tenho certeza. Não posso ter certeza também se a ignorância é uma desvantagem. Mas não é por isso que eu acho que ela ainda leva a melhor: enquanto eu presumo compartilhar ao mesmo tempo da noite, da música e de sua inusitada companhia, a mariposa ignora o som, a minha preocupação, e talvez também a noite com suas possibilidades. Aliás, se existem possibilidades para ela, são apenas duas: ser ou não ser devorada. Isso a obriga a viver no limite. É a fórmula dos românticos para uma vida perfeita. Ou para uma morte perfeita. A comida tem mais sabor, o vôo tem mais prazer. Neste sentido, a mariposa tem uma larga vantagem. Para ela, esta noite é tudo; para mim, é mais uma noite em meio a tantas outras. Sua ignorância a torna plena, enquanto a minha consciência só me recorda da minha finitude. Pego o violão e dedico a isto uma das minhas seis canções. À finitude, então. E à mariposa.
Fevereiro de 2005