7.12.06



Migrânea.



Um grande sinal de que as coisas não estão indo tão bem é quando você começa a desejar que os dias passem depressa. Você já acorda querendo que o dia acabe, que o tempo voe, que o mês passe, para... para quê? Para que parem de ser tão rápidos e possamos nos dar um descanso.

Descanso. É uma palavra pecaminosa hoje, quase uma heresia, falar em descanso quando a armadilha do estresse nos diz que estar angustiado é o mesmo que estar produzindo. E produzir, todos concordam, é a palavra de ordem. Então, vamos nos estressar, ao menos para parecer que estamos criando algo, gerando negócios, aumentando margens de lucro, atendendo mais pacientes, julgando mais causas, descobrindo curas.

Transformamos o mundo num lugar em que ser temperamental e brusco é ser normal, uma reação em cadeia de brutalidade maquiada do que chamamos de realidade. Onde estar relaxado é um absurdo e, vamos admitir, um verdadeiro trabalho de Hércules. Nos estressamos para ir à banca da esquina, por causa do trânsito que quase nos mata diariamente, por causa dos assaltos, por causa do vizinho mal-educado que não abriu a porta nem deu bom-dia, preocupado ele próprio e estressado com suas coisas, suas cobranças, seus papéis.

Nos estressamos porque não damos conta de cuidar da casa, do trabalho, das crianças e ainda arrumar tempo para ser gente e lembrar de ter algum alívio.

Aliás, a diversão também é estressante: quem vai à praia no final de semana tem que acordar mais cedo para não pegar engarrafamento - mas não adianta -, não acha estacionamento, e quando acha, invariavelmente existe um guardador que cobra os olhos da cara para não arranhar o seu carro, tem as crianças gritando no banco de trás, tem o não achar lugar para sentar na areia, nem nas barracas, tem aqueles cidadãos que insistem que seu gosto musical é o melhor do mundo e tocam suas preferidas a pleno volume, tem a areia do frescobol respingando no bronzeado alheio. Admitimos que isso é descanso, voltamos para casa com a ilusão de que o final de semana foi relaxante. E abraçamos o cotidiano da semana com redobrado desconforto.

É aí que os dias tendem a ser iguais. Uma sucessão de igualdades, como naquelas grades com barras que cercam os prédios de hoje, cada barra igualzinha à outra. Diversão de menino é andar depressa, bem perto, olhando para elas, vendo elas passarem rápido, tremeluzentes, como nos filmes em preto e branco do início do século passado. Assim são os dias, passam depressa, e a gente mal os enxerga, em permanente movimento.

Mas isso cansa. E, lá pelo final do ano, a gente fica desejando que tudo isso acabe logo, para termos a chance, aproveitando a aura de recomeço do reveillon, de dar um boot na nossa vida, apertar o reset – e seja o que Deus quiser.

O erro é esperar. Um ano é um giro da Terra ao redor do sol. Um dia é um rodopio dela sobre si mesma. Rotas elipsóides ou circulares não têm começo nem fim, qualquer lugar é um início. 1o de abril, 1o de julho, 9 de janeiro, tanto faz. O importante é o marco, uma mudança sutil ou uma machadada no cotidiano, não faz diferença. Pequenas ou grandes, mudanças nos fazem exercitar aquilo que nos ajuda a nos distanciarmos dos animais: a criatividade. E isto, meus caros amigos, é estar vivo.

Agora, com licença: vocês, eu não sei, mas EU estou indo almoçar na beira da praia.

Um comentário:

Anônimo disse...

Nhé!
Almoçar a beira da praia...
Isso, me castiga.
Preciso descansar, Bito. Descansar feliz.
Preciso tanto...